RAMIRO FARJALLA

Advogado. Pós-Graduado em Direito Ambiental pelo Instituto A Vez do Mestre – IAVM
Mestre em Educação Ambiental pela Universidade Católica de Petrópolis – UCP
Co-autor do artigo sobre Marcos Legais da Educação Ambiental em Petrópolis (RJ): Conquistas e retrocessos, junto com o professor Victor de Araújo Novicki, publicado na Revista Educação On Line da PUC-Rio.
Autor do artigo Educação Ambiental como Instrumento Jurídico nas Empresas, publicado na Revista Justiça e Cidadania.

LEI Nº 12.305/2010 DA POLÍTICA NACIONAL DE RESÍDUOS SÓLIDOS:

OPINIÃO

A Lei nº 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, com a sigla PNRS, na qualidade de lei de políticas públicas, possui artigos que vão além do estabelecimento de direitos e deveres. É uma lei que dipõe diretrizes e objetivos que legitimam a implementação de uma gestão pública, através da articulação entre as três esferas de governo – União, Estados e Municípios e parcerias público-privada, para a elaboração de políticas públicas.

Por fazer parte da legislação ambiental, a articulação dos atores sociais (Estado, mercado e sociedade civil) é essencial, pois o direito a ser tutelado é de todos, cuja finalidade é a preservação do meio ambiente ecologicamente equilibrado, base da sadia qualidade de vida e da dignidade da pessoa humana das gerações presente e futura.

A produção e o descarte de lixo retratam a sociedade, com a visão de mundo cartesiana, ou seja, compartimentada, onde o ambiente ocupado pelos humanos e os elementos da natureza, como a vegetação, os recursos hídricos, o solo, a fauna (da qual fazemos parte por sermos animais) e o ecossistema em geral, são excluídos ou desprovidos de valor. Ainda temos um modo de viver, que a produção e o consumo de coisas se baseiam no excedente para sustentar o mercado, com a crença de ser um único caminho para o desenvolvimento social. Porém, esquece-se que os recursos naturais são finitos e se esgotarão pelo ritmo da exploração para fins de produção e lançamento de produto a ser consumido pela sociedade, cujas sobras ou excedentes são simplesmente descartados, parando nos rios, mares ou encostas, ou formando lixões, que são aterros sem nenhuma ou pouca infraestrutura de cobertura que acaba emitindo o gás metano no ar e o vazamento de chorume, chegando no lençol freático e contaminando o corpo hídrico. Vivemos um modelo de vida que degrada o meio ambiente com exploração de recursos naturais e polui por despejar o excedente de produção e consumo daquilo considerado inservível para os humanos na natureza, nossa base de sobrevivência. Essa lei veio para mudar essa lógica de produção e consumo que a natureza é explorada e tratada como o destino das sobras por serem apenas descartadas, chamadas de lixo.

A dificuldade do cumprimento da lei, em questão, está na carência ainda existente de uma cultura ambientalmente sustentável por parte da sociedade. Dentro da lógica sustentável, que acredido estar conquistando espaço devido o agravamento do desequilíbrio ecológico, que ameaça a saúde e a sobrevivência humana, vide o COVID-19 a título de exemplo, tudo que consumimos pode e deve ser, no mínimo, reaproveitado. Determinando produto pode não servir mais para mim ou você, não atender mais determinada finalidade, mas pode servir para terceiros ou ter uma destinação diversa para atender outras demandas humanas, sejam elas econômicas e sociais. O que chamamos de lixo pode e deve ser destinado para se transformar num insumo para a fabricação de novos produtos, de forma inovadora, com a capacidade tecnológica que os humanos têm, daí, o termo reciclagem, poupando assim novas exploração de recursos naturais e descartes na natureza, preservando o solo, os rios e as encostas. Por conta disso, entrou em vigor a Lei da PNRS.

Fazendo análise da lei em questão, destaco o art. 3º que define, nos seus incisos, conceitos de coleta seletiva, de área contaminada, de controle social, de destinação final ambientalmente adequada, de logística reversa, de reciclagem, de reutilização e dentre outros, para justamente definir as diretrizes para elaboração de políticas públicas a fim de implementar uma gestão de resíduos.

Além do mais, a lei segue, de forma estrutural, pelos princípios e objetivos, inerentes do Direito Ambiental, como o da prevenção, da precaução, do poluidor-pagador, do protetor-recebedor, do desenvolvimento sustentável etc, no art. 6º, dispõe de instrumentos para a elaboração de planos de resíduos sólidos, a realização do inventário e sistema declaratório anual de resíduos sólidos, da coleta seletiva, os sistemas de logística reversa e outras ferramentas relacionadas à implementação da responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos, educação ambiental etc, no art. 8º, estabelece as diretrizes aplicáveis na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos, priorizando a não geração, a redução, a reutilização, a reciclagem, o tratamento dos resíduos sólidos e a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, no art. 9º, os Planos de Resíduos Sólidos nas três esferas de governo (União, Estados e Municípios), previstos nos arts. 15 a 19, e, para finalizar, dispõe sobre o Plano de Gerenciamento, nos arts. 20 a 23.

Em resumo, trata-se de uma lei que legitima e regulamenta a mobilização para o planejamento econômico à condição logística no sentido de atender uma demanda que, há muitos anos, é a principal causadora de impactos ambientais negativos. Todas as vezes que participei de grupos de estudo e trabalho, fazendo curso de capacitação e dando aulas e palestras e, recentemente, participando do GT do Meio Ambiente e Sustentabilidade na elaboração do Planejamento Estratégico para Petrópolis nos próximos 20 anos – PEP 20, o problema da destinação dos resíduos sólidos por falta de eficaz gestão ocupa prioridade para a solução, diagnosticada por membros da sociedade civil.

Tão arraigada é a cultura do descarte e grande a necessidade de transição para a cultura do aproveitamento, que a lei entrou em vigor em 2010, mas o prazo de adaptação para plena implementação foi estendida no art. 54:

Art. 54. A disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos deverá ser implantada até 31 de dezembro de 2020, exceto para os Municípios que até essa data tenham elaborado plano intermunicipal de resíduos sólidos ou plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos e que disponham de mecanismos de cobrança que garantam sua sustentabilidade econômico-financeira, nos termos do art. 29 da Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, para osquais ficam definidos os seguintes prazos: (Redação dada pela Lei nº 14.026, de 2020)

I – até 2 de agosto de 2021, para capitais de Estados e Municípios integrantes de Região Metropolitana (RM) oude Região Integrada de Desenvolvimento (Ride) de capitais; (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

II – até 2 de agosto de 2022, para Municípios com população superior a 100.000 (cem mil) habitantes no Censo2010, bem como para Municípios cuja mancha urbana da sede municipal esteja situada a menos de 20 (vinte)quilômetros da fronteira com países limítrofes; (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

III – até 2 de agosto de 2023, para Municípios com população entre 50.000 (cinquenta mil) e 100.000 (cem mil)habitantes no Censo 2010; e (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

IV – até 2 de agosto de 2024, para Municípios com população inferior a 50.000 (cinquenta mil) habitantes noCenso 2010. (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

§ 1º (VETADO). (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020)

§ 2º Nos casos em que a disposição de rejeitos em aterros sanitários for economicamente inviável, poderão seradotadas outras soluções, observadas normas técnicas e operacionais estabelecidas pelo órgão competente, demodo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais. (Incluídopela Lei nº 14.026, de 2020)

No Estado do Rio de Janeiro, entrou em vigor o Decreto nº 10.936, de 12 de janeiro de 2022, que regulamenta a Lei da PNRS, sendo um bom passo para a articulação entre as esferas de governo para implementar a gestão de resíduos no âmbito regional.

Petrópolis, na qualidade Município, precisa de uma Lei de Política Municipal de Resíduos Sólidos. Os Municípios devem ser os primeiros a tratarem dessa questão por ser de interesse local, pois é onde o governo e a sociedade têm laços mais estreitos.

Prioridade no Planejamento Estratégico para Petrópolis nos próximos 20 ano – PEP20, o destaque do GT do Meio Ambiente e a necessidade da Educação Ambiental para a Gestão Participativa

Em 2019, o Instituto Philippe Guédon – IPG chamou a sociedade civil organizada e o público em geral para participar e contribuir, com o conhecimento, vivência, experiência técnica e profissional, na elaboração do Planejamento Estratégico para Petrópolis nos próximos 20 ano – PEP20, através da organização temática de grupos de trabalho, nas áreas de urbanismos, desenvolvimento econômico, educação, saúde e meio ambiente, enfim, um total de oito GTs.

O propósito do IPG é criar espaços, sejam presenciais e virtuais, para a cidadania participativa, onde pessoas possam trocar ideias e experiências profissionais para elaborar propostas, que são a expressão dos anseios da sociedade, e apresentar ao Poder Público.

O GT do Meio Ambiente se tornou um dos mais atuantes e com maior adesão de pessoas. Certamente, isso se deve pela natureza do próprio tema porque meio ambiente e participação social andam juntos em razão da própria responsabilidade ambiental ser compartilhada entre o Poder Público e a sociedade, embora o constituinte chame de coletividade, no artigo 225 da Constituição Federal, abaixo transcrita:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

No momento da elaboração do PEP 20, na parte ambiental, o grupo colocou as propostas da Gestão de Resíduos Sólidos como urgentes e, muitas delas, de cunho educativo, pois não basta obrigar pessoas a separar o lixo e estabelecer comportamentos ecologicamente corretos.

Dentre as propostas, é necessário dentro da Administração Pública municipal de Petrópolis desenvolver programas de capacitação ambiental para levar informações aos servidores da importância da gestão de resíduos e todo o consumo de produtos no final, ao invés de serem objeto de descarte, podem ter a destinação para se tornarem insumos na fabricação de novos objetos, nas redes municipais de escola intensificar que alunos sejam agentes multiplicadores, educando seus pais, por uma destinação correta de produtos. Conhecer o tipo de material para que este possa ser reciclado ou se transformar em compostagem, ou na falta de alternativa se tornar rejeito e ir para o aterro sanitário, por ter uma estrutura hermética para evitar emissão de gás metano e vazamento de chorume no solo e, por conseguinte, a contaminação dos lençóis freáticos.

A necessidade do cumprimento da lei para a implementação da Gestão de Resíduos, como foi bem ressaltado no PEP 20, tem como destino a preservação ambiental, mas também um novo modelo de produção e consumo menos impactante na natureza, com retorno econômico social, pois regulamenta a oportunidade de trabalho, de forma empreendedora, através da formação e atuação das associações de catadores, que recebem os resíduos separados, e empresas que compram esses resíduos das associações para transformarem em insumos e venderem aos fabricantes para fabricação de novos produtos, compondo assim a logística reversa para a reciclagem. Esse ciclo sustentável poupa os elementos da natureza, chamados de recursos naturais por serem explorados, podendo serem chamados de serviços ecossistêmicos para garantir um desenvolvimento econômico com qualidade de vida, pois a tendência é não ver mais resíduos como garrafas pet às margens dos rios.

A inovação da Lei da PNRS objetiva colocar em prática a ordem jurídica sustentável já prevista na Constituição, não só no art. 225, mas em outros dispositivos constitucionais, como no art. 170, VI, na ordem econômica e financeira, dispondo tratamento diferenciado a produtos que ofereçam maiores impactos ambientais.

Dando continuidade à temática econômica, vale citar o art. 8º, IX, da lei, que dispõe sobre os incentivos fiscais, financeiros e creditícios. Ultimamente, o termo ESG – Environmental, Social and Governance vem ganhando espaço e incentivando empresas a se comprometerem por uma atividade empresarial menos impactantes, gerando menos resíduos e participando da gestão de resíduos, além dos demais compromissos socioambientais, que merecem uma matéria a parte.

Concluindo a análise, a Lei da PNRS veio para trazer mudanças de cultura de produção e consumo, através de uma gestão participativa com representantes do Poder Público e da sociedade civil, sendo esta através de empresas, instituições de ensino e associações civis, bem como nova estrutura na Administração Público nas três esferas do Federalismo brasileiro. Ninguém pode e nem deve ficar de fora.

Por outro lado, para mudar uma cultura precisa-se de educação. Por essa razão, a lei da PNRS, no art. 5º, integra à Politica Nacional do Meio Ambiente – PNMA, Lei nº 6.938/1981, e articula com a Politica Nacional de Educação Ambiental – PNEA, Lei nº 9.795/1999.

Para completar, o art. 3º da PNEA estabelece o processo educativo que envolve o Poder Público, com a obrigação de promover a educação ambiental, conforme o artigo 225, §1º, IV, articulado com a sociedade civil, reforçando a responsabilidade compartilhada.

Precisa-se levar para as instituições de ensino, empresas e comunidades a informação da Lei da PNRS, pois nela se encontra a orientação por um consumo consciente, a importância de se saber quais impactos ambientais causados na produção de determinado produto, a capacidade de transformar um bem considerado imprestável em um outro mais útil, sem explorar da natureza, plantar a semente que vivemos num mundo onde todas as formas de vida são interligadas e a própria vida é um ciclo, ou seja, tudo que se descarta retorna para nós. Esse retorno é preocupante, pois se não houver uma logística reversa ao invés da continuidade do ciclo de produção e consumo para o desenvolvimento econômico-social ocorrerá um colapso porque a poluição das águas e do ar geram queda na saúde da população e desatres naturais.

Para completar, a lei da PNRS representa uma disrupção de modo de vida para que a humanidade consiga sobreviver às mudanças climáticas e reconhecer que a properidade econômica não existe além do ritmo do planeta Terra, pois este é a nossa morada e o alicerce da vida.

Diante dessa questão, o IPG aproveita para chamar mais pessoas para participar do PEP 20 e elaborar mais propostas como a Gestão de Resíduos, pois a educação ambiental prevista na lei acima citada tem a finalidade para mobilização social e a constituição de gestão participativa. Precisamos levar esse tema ao Conselho Municipal do Meio Ambiente – COMDEMA, orgão paritário, onde cidadãos possam participar e opinar, influenciando assim a decisão dos conselheiros.

É o desafio que o IPG propõe com o PEP20.

Quem tiver interesse em participar acesse: https://www.instagram.com/ipgpar/ e https://web.facebook.com/institutoprogestaoparticipativa

Ramiro Farjalla Ferreira

Advogado

Pós-Graduado em Direito Ambiental pelo Instituto A Vez do Mestre – IAVM

Mestre em Educação Ambiental pela Universidade Católica de Petrópolis – UCP

Co-autor do artigo sobre Marcos Legais da Educação Ambiental em Petrópolis (RJ): Conquistas e retrocessos, junto com o professor Victor de Araújo Novicki, publicado na Revista Educação On Line da PUC-Rio.

Autor do artigo Educação Ambiental como Instrumento Jurídico nas Empresas, publicado na Revista Justiça e Cidadania.

Membro Diretor do Instituto Philippe Guédon – IPG

Coordenador do GT05 – Meio Ambiente e Sustentabilidade do Planejamento Estratégico para Petrópolis para os próximos 20 anos – PEP 20.